Insegurança Tributária frente a pandemia do Covid-19

Insegurança Tributária frente a pandemia do Covid-19

Lorena Gargaglione*

O sentimento de medo em decorrência do coronavírus é unanime, estamos diante de uma realidade, até pouco tempo, totalmente inimaginável. Esse sentimento pelo desconhecido é natural, só que está agravado pela instabilidade política, econômica e tributária, vividas em dias de pandemia.

Estamos com medo da morte, do contágio e até do simples abraço, nos isolando completamente como forma de sobrevivência, mostrando todos os dias o quão grande é nosso estado de vulnerabilidade.

Na política, é nítido que estamos nos conectando com máscaras. E, aqui não me refiro à aquela necessária para evitar a transmissão do novo vírus. Personalidades estas que acarretam o agravamento do estrangulamento econômico e por sua vez tributário.

O pavor do colapso econômico se firma a cada novo decreto que prorroga medidas de isolamento social. Não pretendo aqui discorrer sobre as medidas sociais adotadas pelos nossos Governantes, creio que tomaram as melhores decisões que puderam dentro das suas realidades e com auxilio de equipe técnica preparada para enfrentamento da crise que ora nos assola.

Por óbvio estamos lidando com vidas, de formas extremas e totalmente divergentes.

Em decorrência da declaração de pandemia por causa do novo CORONAVÍRUS (COVID-19) pela Organização Mundial de Saúde – OMS, em 11 de março de 2020, a Câmara dos Deputados aprovou a Mensagem Presidencial n. 93/2020, reconheceu estado de calamidade pública no Brasil, vigente até 31 de dezembro de 2020.

Sem menosprezar a importância das medidas adotadas pela Organização Mundial de Saúde no combate a disseminação no novo coronavírus, volto meu olhar ao cenário econômico e as outras vidas diretamente afetadas pela crise na economia.

Em tempos de pandemia resgatou-se o sentimento das crises econômicas vividas no passado, em especial a crise de 1992.

A verdade é que estamos beirando a maior crise econômica mundial.

Sobre a perspectiva de recessão, o ex-economista-chefe do FMI Kenneth Rogoff diz que tem 99% de certeza de que a recessão virá e que “Estamos vendo a economia global mergulhar tão rapidamente que os estatísticos não estão conseguindo medir, de forma precisa, os efeitos no PIB mundial. Minha suspeita é de que, no curto prazo, a queda da economia global será a maior já vista”.

Segundo a OCDE, o Brasil é o país que já mostra sinais claros de esfriamento da atividade comercial.

Diante dessa ‘nova’ realidade, o Governo Federal anunciou medidas tributárias que buscam equilibrar os fortes impactos econômicos causados pela pandemia do COVID-19, na vida das empresas e do povo brasileiro. O déficit orçamentário que já era de R$124 bilhões nas contas públicas devem ser ampliado significativamente em decorrência da pandemia.
Até final de março de 2020, o Ministro da Economia Paulo Guedes, já havia anunciado 750 bilhões, que representam 2,6% do PIB em medidas emergenciais.

Dentre elas, a Resolução n. 152/2020, editada pelo Conselho Gestor do Simples Nacional, na qual ficou decidido o adiamento do vencimento do Simples Nacional, dos meses de março, abril e maio de 2020.

E, recentemente fora anunciada publicação da Portaria n. 139/2020, do Ministério da Economia, na qual possibilidade de postergação do pagamento de impostos federais, dentre eles:

PIS/PASEP e do COFINS: de que tratam o art. 18 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, o art. 10 da Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e o art. 11 da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, relativas às competências março e abril de 2020, ficam postergadas para os prazos de vencimento dessas contribuições devidas nas competências julho e setembro de 2020;
Contribuição Previdenciária Patronal: que trata o artigo 22, da Lei 8.212/91, a cargo dos empregadores, a que se refere o inciso I do caput e o parágrafo único do art. 15 da Lei nº 8.212/91, e a contribuição de que trata o art. 24 da Lei nº 8.212/91, devida pelo empregador doméstico, relativas às competências março e abril de 2020, deverão ser pagas no prazo de vencimento das contribuições devidas nas competências julho e setembro de 2020.
Com o déficit orçamentário no pico do crescimento e a ausência de novas receitas em decorrência da postergação do pagamento dos principais tributos federais, na tentativa de equilibrar as contas públicas tramitam no Congresso Nacional dois Projetos de Lei que prevê a instituição de novos impostos:
*PL 34/2020, prevê a instituição do regime extraordinário fiscal – dentre elas empréstimos compulsórios, para enfrentamento da calamidade pública decorrente da pandemia internacional ; e
*PL 50/2020, prevê a instituição do imposto sobre grandes fortunas e empréstimo compulsório, que financiará as necessidades de proteção social decorrentes da COVID-19.
Embora a grande maioria da população desacredite da possibilidade de instituição de Empréstimos Compulsórios OU Imposto sobre Grandes Fortunas, também jamais poderíamos imaginar que estaríamos vivendo trancados em casa, em “quarentena”, com parte significativa do comércio fechado, com medo de um vírus que é altamente transmissivo. Há pouco mais de um mês esse cenário também era desenhado como inimaginável.

Sem me alongar no assunto, acredito que o momento vivido só reforça o sentimento de que precisamos, mais do que nunca, da Reforma tributária para recuperação da economia do país.

Para completar o cenário catastrófico, onde reina o caos, tudo que não precisamos são cientistas políticos e econômicos de “facebook” propagando realidades irreais, estimulando o medo e pânico.

Estamos sendo bombardeados com fakenews e mensagens que estimulam os empresários a realizarem corte de gastos de forma agressiva em um denominado planejamento econômico, digno de atrapalhados.

O momento é de cautela e de planejamento econômico-tributário organizado, temos que ter muito receio com essas falas e comportamentos irresponsáveis que incitam planejamentos abusivos.

Acredito que o papel da advocacia nesse momento é insubstituível, pois aliado aos empresários, teremos a almejada recuperação econômica vivida em dias de pandemia. O advogado ético será protagonista nesse cenário como responsável por construir alternativas sólidas para minimizar os impactos tributários e econômicos.

É hora de nos adaptarmos as mudanças necessárias e caminharmos de mãos dadas rumo a construção da realidade que queremos!

Reforma do ICMS no Estado

Reforma do ICMS no Estado

O Governo do Estado de Mato Grosso apresentou na sexta-feira, dia 04 de novembro, o Projeto de Lei versão 4.0 – denominado ICMS-CIDADÃO-SINTA 4.0, que dispõe sobre o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e a Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), e tem como diretivas gerais a Simplicidade, Isonomia, Neutralidade, Transparência e Arrecadação (art. 2º do PL, modelo 4.0).

O novo modelo ICMS-CIDADÃO-SINTA 4.0, foi inspirado nos regimes de tributação de países como Nova Zelândia (regido pelo sistema de Democracia parlamentar independente), na tentativa de uma construção pioneira de ICMS no Brasil.

​A Nova Zelândia se tornou referência para os Países que estão enfrentando crise econômica, na medida em que conseguiu superar a crise interna, mantendo um alto nível de transparência, com instalação de mecanismos menos burocráticos e baixo índice de corrupção, o que fez com que em 2013 ocupassem a 4ª posição no índice de liberdade econômica da Heritage Foundation.

Importante destacar, até pelo momento de crise econômica e financeira em que o Brasil se encontram, a coragem do Estado de Mato Grosso em propor a Reforma de tributação do ICMS, que há muito tempo é esperada e sonhada pelos contribuintes mato-grossenses.

Acredito na necessidade da Reforma Tributária não só Estadual como Nacional. Acredito nos princípios que nortearam a elaboração desse novo modelo de tributação, visando à arrecadação do ICMS.

Hoje, no Estado de Mato Grosso as questões primordiais de tributação são instituídas e regulamentadas por meio de Decreto. Vivenciamos um modelo de tributação retrogrado, defasado e extremamente burocrático.

Nesse ponto, a reforma vem a contento. Parafraseando o Prefeito eleito de São Paulo, João Dória, acredito que “quanto menos burocracia menor será a corrupção”.

Ocorre que, mesmo o ICMS sendo de competência estadual e distrital, cabendo ao legislador ordinário sua regulamentação, a ânsia do Estado por um novo regime de tributação, visando à transparência e a isonomia, não pode sobrepor aos princípios Constitucionalmente garantidos.

Destaco, primeiramente, que não são as 470 mil palavras que trazem insegurança jurídica no trato tributário do nosso Estado, mas sim o modelo de controle extrafiscal do ICMS instituídos e regulamentados por meio de Decretos e Portarias.

Insegurança jurídica é a modificação total do regime de tributação do ICMS nos moldes do malfadado Decreto n. 380/2015.

Vou além, ainda que os propósitos sejam aparentemente os melhores, Insegurança Jurídica é a apresentação do Projeto de Lei que modifica todo Sistema de Recolhimento do ICMS, denominado SINTA modelo 4.0, no dia 04 de novembro (sexta-feira) e exigir que o mesmo seja encaminhado ao legislativo para aprovação até dia 20 do mesmo mês, ou seja, com apenas 10 (dez) dias úteis para as discussões com os seguimentos atingidos.

A proposta prevê que as discussões deverão envolver o setor produtivo, a CDL, a Fecomércio, a Famato e a Aprosoja. E, por outro lado concede a Assembleia Legislativa e aos Contribuintes o curto prazo de 10 (dez) dias úteis para realização de todos os debates necessários. Impossível!

Para ficar realmente transparente o Governo podia atender a solicitação da CDL e FECOMÉRCIO, no qual requereu via protocolo a liberação dos valores arrecadados pelo Estado de Mato Grosso, individualizadas por seguimento e qual será a nova arrecadação caso o modelo SINTA 4.0 seja aprovado. Só assim poderemos afirmar que não haverá aumento na carga tributária.

Voltando, ainda, no Decreto n. 380/2015, o Governo poderia publicar sua revogação e conceder prazo hábil para as discussões saudáveis e necessárias do novo modelo de tributação apresentado. Isso, para mim, é transparência!

Outro ponto, de extrema importância, é a instituição de alíquota única ao argumento de “garantia da Isonomia entre os contribuintes” e que “as alíquotas não vão variar de acordo com a cara do freguês”.

Estamos tratando de uma reforma tributária que irá refletir diretamente em toda população mato-grossense, portanto, não se trata de tributação com relação “cara do freguês”.

A Constituição Federal, em seu artigo 155, §2º, III, dispõe que “o ICMS será seletivo em função da essencialidade das mercadorias e serviços”.

Deve o legislador ordinário, ao encampar a tão sonhada reforma de tributação do ICMS, atender as necessidades de um padrão de vida mínimo, garantindo a dignidade da pessoa humana, prevista no inciso III, do artigo 1º da CF/88.

Com a implementação da alíquota única os gêneros de primeira necessidade terão carga tributária idêntica aos produtos supérfluos. E, aqui, deixo registrado o ponto de ilegalidade no novo modelo apresentado.

E, já que estamos tratando de um modelo de tributação inspirado em Países pioneiros, podíamos, então, isentar o ICMS sobre os produtos de primeira necessidade, garantindo que Mato Grosso seja referência no trato da dignidade humana, uma vez que a preocupação em apresentar um novo modelo de tributação é o custeio da saúde pública.

Para finalizar meu ‘breve’ posicionamento, o Governo do Estado ao apresentar o novo modelo de tributação sustenta a redução do ICMS nas faturas de energia elétrica, que atualmente possuem alíquota de 27% (alegadas pelo Secretário que se somadas por dentro beiram a 40%) para 25%.

Esse posicionamento é rechaçado pelo Poder Judiciário (Ag. Rec. No Recurso Extraordinário 734.881/SC), inclusive pelo Procurador da República, Dr. Rodrigo Janot, em parecer proferido no bojo do Recurso Extraordinário 714.139 SC.

Em observância aos Princípios Constitucionais da Seletividade e Essencialidade, a alíquota do ICMS nas faturas de energia elétrica não pode ser superior a alíquota média cobrada pelo Estado.

Dessa forma, ainda sob a vigência do atual modelo de tributação a alíquota deveria ser 17%. E, caso venha a ser aprovado o ICMS SINTA 4.0 com alíquotas que variam de 12% a 18%, o ICMS sobre as faturas de energia elétrica não poderiam ser superiores a esses patamares.

Os contribuintes, realmente, são fregueses no quesito arrecadação de ICMS no Estado de Mato Grosso.

Os desafios da Reforma Tributária

Os desafios da Reforma Tributária

Não é de hoje que se ventila a possibilidade de REFORMA no modelo atual de tributação brasileira, tanto é que para maioria dos especialistas o assunto já caiu em descredito.

Ocorre que, o que parecia utopia voltou a ser manchete após o imbróglio acerca da tributação sobre a comercialização dos combustíveis e o desafio realizado pelo Presidente Jair Bolsonaro de “que poderia zerar os impostos federais se os Governadores zerassem o ICMS”, o assunto vem ganhando força e não se fala em outra coisa que senão REFORMA TRIBUTÁRIA.

Isso porque o Ministro da Economia Paulo Guedes anunciou em reunião com os governadores dos Estados e Distrito Federal que a tributação sobre os combustíveis seria tema para discussão na r. reforma quando da revisão do pacto federativo.
Após, o Congresso Nacional anunciou a retomada da Reforma Tributária, via aprovação de criação da Comissão Mista Temporária, conforme Ato Conjunto do Presidente do Senado Federal e da Câmara dos Deputados n. 01/2020, aprovado em 19 de fevereiro de 2020, composto por 25 membros do Congresso e 25 do Senado, cujo trabalho é unificar as propostas de Reforma Tributária em tramite nas duas casas, sendo PEC 110/2019 no Senado e PEC 45/2019 na Câmara, no prazo recorde de 45 dias.

Em apertada síntese, as duas Propostas em trâmite tem como base a extinção de uma série de tributos, consolidando as bases tributáveis em dois novos impostos:

(i) um imposto sobre bens e serviços (IBS), nos moldes dos impostos sobre valor agregado cobrados na maioria dos países desenvolvidos; e

(ii) um imposto específico sobre alguns bens e serviços (Imposto Seletivo).

Em ambas propostas discutidas no Congresso Nacional, até o presente momento, propõem a extinção do ICMS (tributo de competência dos Estados) e ISS (tributo de competência dos Municípios).

A par disso, o Governo Federal afirmou a possibilidade de encaminhar proposta ao Congresso Nacional, que devera ser apresentada em três etapas. Sendo que a primeira versa sobre a tributação incidente sobre o consumo, proposta que já tramita junto ao Congresso Nacional, aqui denominada Imposto sobre Valor Agregado – IVA.

Já a segunda etapa versa sobre criação de um imposto sobre cigarros e bebidas. E, por fim a terceira etapa versa sobre a mudança no Imposto de Renda e retomada da tributação sobre lucros e dividendos, e desoneração da folha de pagamentos.
Superado os apontamentos acerca dos cenários atuais, o que por um lado gera muita expectativa nos brasileiros que anseiam uma tributação justa e razoável, de outro gera enorme preocupação.

Apesar de tão sonhada acredito que as propostas em trâmite afetam arrecadação dos estados que não concentram sua renda no consumo, no caso Mato Grosso. E, o que era para ser justo acabara dando ensejo a um colapso financeiro.
Todos sabemos e sentimos no bolso a importância da Reforma. Prova disso é que ainda estamos no segundo mês do ano e já superamos 450 bilhões em arrecadação. Sem contar que pelo 4ª ano consecutivo mantivemos a média de 153 dias trabalhados só para pagar impostos.

Acredito que a REFORMA TRIBUTÁRIA é necessária e bem-vinda, quanto ao objetivo de simplificação, tributação justa e maior transparência.

Porém, se a proposta contém mudança na sistemática de arrecadação dos Estados (ICMS) e Municípios (ISS), acredito que seus representantes devem participar da construção de uma nova proposta, com objetivo de que se chegue a um consenso sobre uma tributação justa para todos, sob pena de consertarmos um erro com outro e continuarmos com uma legislação cheia de retalhos.

A derrama do século XXI

A derrama do século XXI

Assim como antigamente, os contribuintes recebem o rótulo de “sonegadores”

Em 2019 iremos completar 230 anos da Inconfidência Mineira[1] – ocorrida no ano de 1789, que deixou como marco a execução de Joaquim José da Silva Xavier – Tiradentes, dois anos após a tentativa frustrada de liberdade do povo brasileiro contra o regime da DERRAMA imposto pela Coroa Portuguesa.

Considerada conspiração a Inconfidência Mineira foi um dos primeiros movimentos em busca da independência. O Brasil (colônia de Portugal, à época) sofria com abusos políticos e cobrança alta de taxas e impostos.

Visando o aumento de arrecadação a Coroa Portuguesa aumentou os impostos que já eram exorbitantes por meio da instituição do quinto, que consistia na retenção de 20% do ouro de Minas Gerais.

Porém, ao longo de um ano caso o quinto não correspondesse a cem arrobas, valor mínimo para arrecadação, a Coroa decretava a ‘derrama’.

Embora a Proclamação da República tenha ocorrido em 15 de novembro de 1889, há exatos 130 anos, não é difícil fazer analogia com a realidade que o Brasil vive nos dias de hoje.

Com uma das cargas tributárias mais elevadas do mundo seguimos repetindo os mesmos erros do passado, com sistema tributário massacrante seguimos matando nossas empresas.

Segundo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação, no ano de 2018 o brasileiro trabalhou até 2 de junho para pagar tributos. No estudo constatou-se que “o brasileiro trabalha 29 (vinte e nove) dias do ano em 2018, só para pagar os rombos causados pela corrupção no país.”

O aumento desenfreado com os gastos públicos, a má gestão e a corrupção fazem renascer o regime da derrama.
Ainda que o inciso LIV, do artigo 5ª da Magna Carta tenha intuito de assegurar que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”, que quer dizer que sem ordem judicial não podem mais entrar em nossas casas e nos tirem tudo que possuímos de valor como fazia a Coroa Portuguesa, mas infelizmente hoje fazem pior.

Mesmo que o contribuinte brasileiro esteja em dia com o recolhimento dos impostos, em percentuais absurdos, o atual sistema governamental, contrariando a Constituição Federal, nos rouba a dignidade, a segurança, a liberdade.
Não podemos mais ser condenados à execução, mas vemos milhares de iguais executados todos os dias.
A sociedade que deveria ser constituída de iguais se vê frágil e acuada ante a mão pesada do Fisco que a cada vez mais se utiliza de meios espúrios como forma de aumento da arrecadação.

A arrecadação do tributo que é conhecida desde que vivemos em sociedade, instituída com único intuito de custear a manutenção do Estado, hoje perde sua finalidade.

Estamos sobretaxados e supertributados já que temos que custear a abarrotada folha de salários, a ganância dos governantes e a corrupção institucionalizada.

Ano após ano, o Fisco busca novas brechas para aumentar a arrecadação, num verdadeiro estrangulamento social e empresarial, sem antes cortar seus luxos e supérfluos.

Assim como antigamente, os contribuintes que buscam a liberdade do massacre tributário recebem o rótulo de “conluio” e “sonegadores”, quando em verdade estão apenas lutando para ver valer a nossa Constituição e tentando sobreviver em meio ao caos financeiro instaurado.

Até quando nosso povo continuará sangrando sem o socorro que lhe é constitucionalmente assegurado?
Infelizmente vamos completar 230 anos de uma triste história que se repete, diariamente.

LORENA GARGAGLIONE é advogada tributarista.

“Dai, pois, a César o que é de César”

“Dai, pois, a César o que é de César”

Ser advogada tributarista em um momento único para economia brasileira é desafiador e me faz questionar, com frequência, qual nosso propósito diante do cenário flagelante que vivemos.

Que o Fisco é famigerado contumaz isso todo contribuinte sabe, ou melhor, sente. Porém, nunca esteve tão latente seu intuito em arrecadar além do necessário para manutenção do Estado, ultrapassando o limite moderado de tributação.

A função primordial do tributo foi deturpada há muito tempo. A palavra que tem origem do latim “Tributum” – e significado em sentido estrito como “receitas derivadas (por oposição às receitas originárias, produzidas pelo patrimônio público), arrecadadas pelo Estado, para financiar a despesa pública, seja com a guerra, a defesa contra o inimigo externo e a segurança interna, seja com o bem-estar dos cidadãos.” Amaro da Silva (1991, p. 239).

Tributar é na verdade o marco do abandono do estado natural, definido por Hobbes[1], consiste no pagamento de pecúnia para o financiamento do Estado democrático e a coletividade.

Fomos doutrinados sobre o DEVER MORAL de pagar IMPOSTOS, inclusive com citação bíblica: “Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus.»” (Mateus 22:21).

Pelo costume não questionamos, com a devida atenção que o assunto merece, qual real destinação e necessidade dos Impostos cobrados pelo Fisco. E, diante dessa inércia o Estado vai extrapolando os limites da tributação, apertando a população, esmagando a sociedade civil. Sem contar que as empresas, muitas das vezes, acabam sendo vítimas desse sistema falido.

Dentre todos os PODERES e DEVERES do Estado a tributação me parece ser a mais essencial. Acredito que temos que dar “a César o que é de César”, pagando nossos Tributos em dia.

Isso não significa que temos que dar tudo que César pede. Daí o que é justo e necessário para manutenção da sociedade.
Não estou dizendo que não temos que pagar tributos. Muito pelo contrário, antes de ser um DEVER do cidadão-contribuinte é um PODER, uma GARANTIA CONSTITUCIONAL, pagar o Tributo devido e necessário. Porém, a Tributação precisa ser justa sob pena de deturpar os próprios princípios sociais e morais.

O que não é justo é o aumento desenfreado de Impostos para manutenção desse Sistema-Tributário extremamente caro e pior ainda custear a corrupção, que impera em nosso País.

Não podemos e nem devemos ter medo de questionar esse modelo retrogrado e exacerbado. O que se exerce é um atentado contra a própria sociedade, destruindo por vias transversas a economia.

O Brasil tem um modelo tributário altamente regressivo, que destoa do modelo de tributação dos países com prestação de serviço público eficaz. Precisamos de Reforma no Sistema Político, Trabalhista, Previdenciário e por consequência Tributário.
Agora pensar em Reforma Tributária com cunho de aumentar a arrecadação, majorando a carga tributária é uma visão míope e medíocre!

A economia já está prejudicada, aumentar impostos, alíquotas, base de calculo, acarretando por consequência o aumento da Carga Tributária vai inviabilizar ainda mais o Sistema. Não ao contrário!

Esclarecendo, com intuito de construir um sistema econômico simples e eficiente, recuperando a economia Nacional e Estadual, a União e o Estado de Mato Grosso estão discutindo, simultaneamente, a Reforma Tributária Nacional e a Reforma do ICMS/MT. Ambas, ansiosamente aguardadas pelos empresários, contribuintes e por nós, tributaristas.

Limitando, minha pueril analise, apenas sobre a Reforma Estadual do ICMS, ainda a vejo com certo receio. Reforma no Sistema Tributário de arrecadação do ICMS exige mais pilares que o SINTA/MT pode abranger.

É latente a preocupação dos empresários mato-grossenses sobre a possibilidade do aumento da Carga Tributária pelo Estado. Esse é a maior ponto de estrangulamento da Reforma.

Na contramão do que parece estar indo Mato Grosso, a Reforma Tributária Nacional nos moldes apresentados promete uma redução de 2% (dois por cento) da Carga Tributária. Os Estados Unidos de igual forma propõem redução dos Impostos.
Em tempos no qual se discutem “que os brasileiros trabalham uma média de 5 meses por ano para pagar impostos, o primeiro mês só para pagar ICMS” dados apresentados pela Revista Veja de março desse ano, e “custos da corrupção no Brasil”, inclusive com matéria apresentada no Programa Fantástico, que foi ao ar no dia 04/06/2017, me parece não razoável o aumento da Carga Tributária. Definitivamente, acredito que a saída não seja essa!

Plagiando o Presidente da Fenacom – Federação Nacional das Empresas de Serviços Contábeis, Mário Elmir Berti, “o que precisamos é de uma reforma nos padrões morais e éticos”.

Por fim, concluo remetendo ao que acredito ser o propósito que pelo qual me disponho a compreender e atuar nessa área do direito (tributário) que tanto me dedico, tenho esperança de que essas Reformas tragam uma tributação justa e equilibrada. E, devemos todos fazer parte dessa mudança.

[1] Thomas Hobbes: a necessidade da criação do estado – Jecson Girão Lopes.

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Lorena Dias Gargaglione é advogada tributarista.

Desenquadramento do Prodeic

Desenquadramento do Prodeic

Com a devida vênia, antes de adentrarmos ao cerne principal do tema que me proponho a discorrer, mister se faz trazer argumentos importantes para a compreensão do assunto.

O benefício fiscal do Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial (Prodeic) está regulamentado pela Lei Estadual n. 7.958/2003, que dispõe sobre o Plano de Desenvolvimento de Mato Grosso, criou no inciso I, do artigo 1º, o programa, tendo o objetivo de assegurar condições para o pleno desenvolvimento da Indústria, do Comércio, dos Serviços da Produção Mineral e de Energia, na qual é um modulo do programa (alínea a, inciso I, art. 2º), que prevê a concessão de incentivos fiscais de isenções parciais ou totais do ICMS as empresas que se dispuserem a sua adesão (facultativa), através do cumprimento de requisitos delineados em Termo de Acordo.

A posteriori, adveio a Lei n. 9.932/2013 que alterou a redação de alguns artigos da Lei supra mencionada, estabelecendo no artigo 8º quais seguimentos consideram prioritários para o desenvolvimento do Prodeic no Estado de Mato Grosso, sem qualquer vedação expressa a seguimentos.

Dessa forma, as empresas mato-grossenses que tenham interesse e preencham os requisitos impostos nas leis supra, podem requerem junto à Sedec seu enquadramento no benefício.  Ressalta-se que para sua concessão há as inúmeras regras e condições criteriosas.

O Estado de Mato Grosso não concede benefícios fiscais com intuito de “ajudar” essas empresas futuramente beneficiadas. E, sim, que estas se tornem parceiras do Estado no fomento ao crescimento, com a consequente geração de empregos e renda, imputando as empresas beneficiadas inúmeros requisitos onerosos.

Entre eles, como não possuir dívidas com o a Fazenda Estadual, estar regular com os órgãos de fiscalização ambiental, comprovar participação no programa “Primeiro Emprego”, vedação ao crédito de ICMS das cadeias anteriores (em afronta a Lei Kandir) ou quaisquer créditos que tenham direito, entre outros.

Até aí, tudo bem. O Estado assume que não é capaz de sozinho fomentar seu crescimento, gerar empregos e trazer novas rendas, recorrendo as empresas que aqui se encontram ou trazendo novas empresas, para que estas assumam parte de suas responsabilidades sociais, em troca da concessão do benefício de diferimento do ICMS.

Superado os apontamentos supra, desde 2015, o Estado de Mato Groso tem desenquadrado inúmeras empresas ao argumento de que estas não se enquadram no ramo de industrialização, não fazendo parte dos seguimentos beneficiados pela Lei, posto que são do comércio ou cerealistas, que não realizem qualquer forma de beneficiamento de grãos.
Argumento estapafúrdio!

Pela leitura das Leis supramencionadas e em plena vigência, temos que: 1) o contribuinte – sendo inclusive pessoa física 2) que preencher os requisitos no artigo 6ª e 6ª-A, pode fazer jus ao benefício fiscal do Prodeic. Porém, consideram-se prioritários ao desenvolvimento de Mato Grosso as atividades descritas no §1º do art. 8º da Lei n.º 9.932/2013.

O que existe é tão somente a inserção do artigo 8ª pela Lei n. 9.932/2013 e corroborada pelo artigo 5º do Decreto n. 1.943/2013, especificando quais seguimentos são considerados prioritários ao desenvolvimento do Estado de Mato Grosso.
Pela leitura de todos os dispositivos que regulamentam o tema – concessão de benefício fiscal por meio do Prodeic, verifica-se que não há vedação expressa ao setor do comércio ou cerealistas, que não realizem qualquer forma de beneficiamento de grãos.

O que existe, em verdade são Resoluções exaradas pelo Cedem, que vedam a concessão do benefício fiscal para determinados seguimentos. São elas:

A)  Resolução Cedem n. 08/2015, que veda a concessão do Prodeic para beneficiadoras de grãos que não se enquadrarem na seção de indústria e transformação ou que só realizam processo de pré-limpeza, secagem e/ou armazenagem, e também no Parecer n. 327/SGA/2015 da PGE/MT, que ratificou o entendimento firmado pela aludida resolução.

B)  E Resolução n. 020/2015 do Cedem, que o segmento econômico da empresa do comércio, não faz jus ao direito de recebimento dos benefícios fiscais oriundos do Prodeic, conforme parecer da PGE/MT nº 22/SGF/2015.

Sem breves delongas, Resolução não tem força de Lei e não pode retroagir a ponto de prejudicar o ato jurídico perfeito, sob pena de lesão ao Princípio da Segurança Jurídica, em afronta a previsão do artigo 5º, XXXVI[1] da Constituição Federal e o artigo 178 do CTN[2], vez que este foi concedido por prazo certo e condição onerosa, sendo a matéria em apreço já sumulada pelo Supremo Tribunal Federal, nos termos da Súmula 544.

É nítido que as empresas lesadas com desenquadramento não pretendem burlar o Fisco Estadual ou lesar o erário, ao contrário, estas que se encontram lesadas e atualmente buscam socorro do Poder Judiciário para fazer valer seus direitos amplamente demonstrados na exordial, dentre eles a segurança jurídica, o ato jurídico perfeito, a confiança, a irretroatividade da norma em seu prejuízo e o livre exercício de suas atividades profissionais, que em grande parte se encontram sob risco iminente de falência.

Essas empresas desenquadradas por estes argumentos não buscam a anistia ou extinção do pagamento do tributo do ICMS, pleiteiam o pagamento do tributo nos moldes termo de acordo firmado junto ao Estado de Mato Grosso, durante o prazo previsto.

Contribuinte algum pode ficar à mercê da mudança das políticas públicas tributárias. Ora, o Poder Executivo entende que faz parte do plano de crescimento a isenção ao segmento do comércio e cerealistas e num lapso de memória após dar inúmeros ônus e vultuosos investimentos por parte destes contribuintes de boa-fé passa o Estado a entender que já não é mais importante tais isenções, revogando a seu bel prazer com intuito nitidamente arrecadatório.

O ilustre doutrinador Alexandre Sorman já afirmava que: “Isso não queria dizer que a lei não pudesse ser interpretada, pelo contrário, como alertava Aristóteles, as mudanças na legislação são esperadas com a época vivida, todavia, não podemos acostumar o cidadão comum à alteração constante da lei, vez que isso compromete a confiança no judiciário e, consequentemente, a sua eficácia em aplicabilidade”.[3]

Ou seja, após os contribuintes promoverem crescimento econômico do Estado e aqui deixar inúmeros investimentos, gerando emprego e renda, o Estado de Mato Grosso já beneficiado revoga unilateralmente os benefícios fiscais por ele próprio concedidos.

Caso o Estado tenha dado benefício a empresas desse seguimento e estas estejam cumprindo com os requisitos onerosos e não estejam envolvidas em fraude para sua concessão, seu benefício deve se manter vigente pelo tempo previsto no Termo de Acordo.

Acredito que os desenquadramentos são fundamentados na ânsia do Estado em arrecadar tributo ‘indevido’, posto que fora concedido isenção tributária sob condições extremamente onerosas ao contribuinte, mascarado ao argumento “medíocre” de proteção ao erário.
Não estou dizendo que as empresas com benefícios fiscais não podem ser desenquadradas, podem sim!

Mas, entendo que o único motivo que pode ensejar os desenquadramentos são nos casos em que a fraude seja comprovada, mediante processo regularmente válido, respeitando o contraditório e a ampla defesa ou nos casos em que as empresas beneficiadas não cumpram com os requisitos absurdamente onerosos pactuados no Termo de Acordo.

Portanto, se o Estado de Mato Grosso mudou suas Políticas Públicas, entendendo que não é mais vantajoso a concessão de benefício fiscal do Prodeic para o comércio e os cerealistas, que essa vedação seja feita mediante Lei e que não possa retroagir aos beneficiados que cumpram regularmente com os requisitos onerosos impostos pelo Estado e não estejam envolvidos nos escândalos relacionados à Operação Sodoma.

São essas minhas breves considerações sobre o tema.

LORENA DIAS GARGAGLIONE é advogada, sócia-fundadora do escritório Guedes & Gargaglione Advogados Associados, atua com Direito Tributário desde 2008. Pós-graduada em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBET). Pós-graduada em Direito Tributário e Responsabilidade Fiscal pelo Curso Fórum. Pós-graduada em Processo Civil pela Fundação Escola Superior do Ministério Público. Atual vice-presidente da Comissão de Estudos Tributário e Defesa do Contribuinte da OAB-MT. Membro da Associação Brasileira de Direito Tributário (ABAT). E membro da Associação Brasileira de Contribuintes (Abcont). 

[1] Art. 5º, inciso XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.

[2] Art. 178 – A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104.

[3] SORMANI, Alexandre. Inovações da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade: uma visão crítica da Lei n. 9.868/99 sob o viés do princípio da segurança jurídica. p. 35-36

Edilauson Monteiro dos Santos Advogado – OAB/MT 25.544