Insegurança Tributária frente a pandemia do Covid-19

Insegurança Tributária frente a pandemia do Covid-19

Lorena Gargaglione*

O sentimento de medo em decorrência do coronavírus é unanime, estamos diante de uma realidade, até pouco tempo, totalmente inimaginável. Esse sentimento pelo desconhecido é natural, só que está agravado pela instabilidade política, econômica e tributária, vividas em dias de pandemia.

Estamos com medo da morte, do contágio e até do simples abraço, nos isolando completamente como forma de sobrevivência, mostrando todos os dias o quão grande é nosso estado de vulnerabilidade.

Na política, é nítido que estamos nos conectando com máscaras. E, aqui não me refiro à aquela necessária para evitar a transmissão do novo vírus. Personalidades estas que acarretam o agravamento do estrangulamento econômico e por sua vez tributário.

O pavor do colapso econômico se firma a cada novo decreto que prorroga medidas de isolamento social. Não pretendo aqui discorrer sobre as medidas sociais adotadas pelos nossos Governantes, creio que tomaram as melhores decisões que puderam dentro das suas realidades e com auxilio de equipe técnica preparada para enfrentamento da crise que ora nos assola.

Por óbvio estamos lidando com vidas, de formas extremas e totalmente divergentes.

Em decorrência da declaração de pandemia por causa do novo CORONAVÍRUS (COVID-19) pela Organização Mundial de Saúde – OMS, em 11 de março de 2020, a Câmara dos Deputados aprovou a Mensagem Presidencial n. 93/2020, reconheceu estado de calamidade pública no Brasil, vigente até 31 de dezembro de 2020.

Sem menosprezar a importância das medidas adotadas pela Organização Mundial de Saúde no combate a disseminação no novo coronavírus, volto meu olhar ao cenário econômico e as outras vidas diretamente afetadas pela crise na economia.

Em tempos de pandemia resgatou-se o sentimento das crises econômicas vividas no passado, em especial a crise de 1992.

A verdade é que estamos beirando a maior crise econômica mundial.

Sobre a perspectiva de recessão, o ex-economista-chefe do FMI Kenneth Rogoff diz que tem 99% de certeza de que a recessão virá e que “Estamos vendo a economia global mergulhar tão rapidamente que os estatísticos não estão conseguindo medir, de forma precisa, os efeitos no PIB mundial. Minha suspeita é de que, no curto prazo, a queda da economia global será a maior já vista”.

Segundo a OCDE, o Brasil é o país que já mostra sinais claros de esfriamento da atividade comercial.

Diante dessa ‘nova’ realidade, o Governo Federal anunciou medidas tributárias que buscam equilibrar os fortes impactos econômicos causados pela pandemia do COVID-19, na vida das empresas e do povo brasileiro. O déficit orçamentário que já era de R$124 bilhões nas contas públicas devem ser ampliado significativamente em decorrência da pandemia.
Até final de março de 2020, o Ministro da Economia Paulo Guedes, já havia anunciado 750 bilhões, que representam 2,6% do PIB em medidas emergenciais.

Dentre elas, a Resolução n. 152/2020, editada pelo Conselho Gestor do Simples Nacional, na qual ficou decidido o adiamento do vencimento do Simples Nacional, dos meses de março, abril e maio de 2020.

E, recentemente fora anunciada publicação da Portaria n. 139/2020, do Ministério da Economia, na qual possibilidade de postergação do pagamento de impostos federais, dentre eles:

PIS/PASEP e do COFINS: de que tratam o art. 18 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, o art. 10 da Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e o art. 11 da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, relativas às competências março e abril de 2020, ficam postergadas para os prazos de vencimento dessas contribuições devidas nas competências julho e setembro de 2020;
Contribuição Previdenciária Patronal: que trata o artigo 22, da Lei 8.212/91, a cargo dos empregadores, a que se refere o inciso I do caput e o parágrafo único do art. 15 da Lei nº 8.212/91, e a contribuição de que trata o art. 24 da Lei nº 8.212/91, devida pelo empregador doméstico, relativas às competências março e abril de 2020, deverão ser pagas no prazo de vencimento das contribuições devidas nas competências julho e setembro de 2020.
Com o déficit orçamentário no pico do crescimento e a ausência de novas receitas em decorrência da postergação do pagamento dos principais tributos federais, na tentativa de equilibrar as contas públicas tramitam no Congresso Nacional dois Projetos de Lei que prevê a instituição de novos impostos:
*PL 34/2020, prevê a instituição do regime extraordinário fiscal – dentre elas empréstimos compulsórios, para enfrentamento da calamidade pública decorrente da pandemia internacional ; e
*PL 50/2020, prevê a instituição do imposto sobre grandes fortunas e empréstimo compulsório, que financiará as necessidades de proteção social decorrentes da COVID-19.
Embora a grande maioria da população desacredite da possibilidade de instituição de Empréstimos Compulsórios OU Imposto sobre Grandes Fortunas, também jamais poderíamos imaginar que estaríamos vivendo trancados em casa, em “quarentena”, com parte significativa do comércio fechado, com medo de um vírus que é altamente transmissivo. Há pouco mais de um mês esse cenário também era desenhado como inimaginável.

Sem me alongar no assunto, acredito que o momento vivido só reforça o sentimento de que precisamos, mais do que nunca, da Reforma tributária para recuperação da economia do país.

Para completar o cenário catastrófico, onde reina o caos, tudo que não precisamos são cientistas políticos e econômicos de “facebook” propagando realidades irreais, estimulando o medo e pânico.

Estamos sendo bombardeados com fakenews e mensagens que estimulam os empresários a realizarem corte de gastos de forma agressiva em um denominado planejamento econômico, digno de atrapalhados.

O momento é de cautela e de planejamento econômico-tributário organizado, temos que ter muito receio com essas falas e comportamentos irresponsáveis que incitam planejamentos abusivos.

Acredito que o papel da advocacia nesse momento é insubstituível, pois aliado aos empresários, teremos a almejada recuperação econômica vivida em dias de pandemia. O advogado ético será protagonista nesse cenário como responsável por construir alternativas sólidas para minimizar os impactos tributários e econômicos.

É hora de nos adaptarmos as mudanças necessárias e caminharmos de mãos dadas rumo a construção da realidade que queremos!

Reforma do ICMS no Estado

Reforma do ICMS no Estado

O Governo do Estado de Mato Grosso apresentou na sexta-feira, dia 04 de novembro, o Projeto de Lei versão 4.0 – denominado ICMS-CIDADÃO-SINTA 4.0, que dispõe sobre o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e a Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), e tem como diretivas gerais a Simplicidade, Isonomia, Neutralidade, Transparência e Arrecadação (art. 2º do PL, modelo 4.0).

O novo modelo ICMS-CIDADÃO-SINTA 4.0, foi inspirado nos regimes de tributação de países como Nova Zelândia (regido pelo sistema de Democracia parlamentar independente), na tentativa de uma construção pioneira de ICMS no Brasil.

​A Nova Zelândia se tornou referência para os Países que estão enfrentando crise econômica, na medida em que conseguiu superar a crise interna, mantendo um alto nível de transparência, com instalação de mecanismos menos burocráticos e baixo índice de corrupção, o que fez com que em 2013 ocupassem a 4ª posição no índice de liberdade econômica da Heritage Foundation.

Importante destacar, até pelo momento de crise econômica e financeira em que o Brasil se encontram, a coragem do Estado de Mato Grosso em propor a Reforma de tributação do ICMS, que há muito tempo é esperada e sonhada pelos contribuintes mato-grossenses.

Acredito na necessidade da Reforma Tributária não só Estadual como Nacional. Acredito nos princípios que nortearam a elaboração desse novo modelo de tributação, visando à arrecadação do ICMS.

Hoje, no Estado de Mato Grosso as questões primordiais de tributação são instituídas e regulamentadas por meio de Decreto. Vivenciamos um modelo de tributação retrogrado, defasado e extremamente burocrático.

Nesse ponto, a reforma vem a contento. Parafraseando o Prefeito eleito de São Paulo, João Dória, acredito que “quanto menos burocracia menor será a corrupção”.

Ocorre que, mesmo o ICMS sendo de competência estadual e distrital, cabendo ao legislador ordinário sua regulamentação, a ânsia do Estado por um novo regime de tributação, visando à transparência e a isonomia, não pode sobrepor aos princípios Constitucionalmente garantidos.

Destaco, primeiramente, que não são as 470 mil palavras que trazem insegurança jurídica no trato tributário do nosso Estado, mas sim o modelo de controle extrafiscal do ICMS instituídos e regulamentados por meio de Decretos e Portarias.

Insegurança jurídica é a modificação total do regime de tributação do ICMS nos moldes do malfadado Decreto n. 380/2015.

Vou além, ainda que os propósitos sejam aparentemente os melhores, Insegurança Jurídica é a apresentação do Projeto de Lei que modifica todo Sistema de Recolhimento do ICMS, denominado SINTA modelo 4.0, no dia 04 de novembro (sexta-feira) e exigir que o mesmo seja encaminhado ao legislativo para aprovação até dia 20 do mesmo mês, ou seja, com apenas 10 (dez) dias úteis para as discussões com os seguimentos atingidos.

A proposta prevê que as discussões deverão envolver o setor produtivo, a CDL, a Fecomércio, a Famato e a Aprosoja. E, por outro lado concede a Assembleia Legislativa e aos Contribuintes o curto prazo de 10 (dez) dias úteis para realização de todos os debates necessários. Impossível!

Para ficar realmente transparente o Governo podia atender a solicitação da CDL e FECOMÉRCIO, no qual requereu via protocolo a liberação dos valores arrecadados pelo Estado de Mato Grosso, individualizadas por seguimento e qual será a nova arrecadação caso o modelo SINTA 4.0 seja aprovado. Só assim poderemos afirmar que não haverá aumento na carga tributária.

Voltando, ainda, no Decreto n. 380/2015, o Governo poderia publicar sua revogação e conceder prazo hábil para as discussões saudáveis e necessárias do novo modelo de tributação apresentado. Isso, para mim, é transparência!

Outro ponto, de extrema importância, é a instituição de alíquota única ao argumento de “garantia da Isonomia entre os contribuintes” e que “as alíquotas não vão variar de acordo com a cara do freguês”.

Estamos tratando de uma reforma tributária que irá refletir diretamente em toda população mato-grossense, portanto, não se trata de tributação com relação “cara do freguês”.

A Constituição Federal, em seu artigo 155, §2º, III, dispõe que “o ICMS será seletivo em função da essencialidade das mercadorias e serviços”.

Deve o legislador ordinário, ao encampar a tão sonhada reforma de tributação do ICMS, atender as necessidades de um padrão de vida mínimo, garantindo a dignidade da pessoa humana, prevista no inciso III, do artigo 1º da CF/88.

Com a implementação da alíquota única os gêneros de primeira necessidade terão carga tributária idêntica aos produtos supérfluos. E, aqui, deixo registrado o ponto de ilegalidade no novo modelo apresentado.

E, já que estamos tratando de um modelo de tributação inspirado em Países pioneiros, podíamos, então, isentar o ICMS sobre os produtos de primeira necessidade, garantindo que Mato Grosso seja referência no trato da dignidade humana, uma vez que a preocupação em apresentar um novo modelo de tributação é o custeio da saúde pública.

Para finalizar meu ‘breve’ posicionamento, o Governo do Estado ao apresentar o novo modelo de tributação sustenta a redução do ICMS nas faturas de energia elétrica, que atualmente possuem alíquota de 27% (alegadas pelo Secretário que se somadas por dentro beiram a 40%) para 25%.

Esse posicionamento é rechaçado pelo Poder Judiciário (Ag. Rec. No Recurso Extraordinário 734.881/SC), inclusive pelo Procurador da República, Dr. Rodrigo Janot, em parecer proferido no bojo do Recurso Extraordinário 714.139 SC.

Em observância aos Princípios Constitucionais da Seletividade e Essencialidade, a alíquota do ICMS nas faturas de energia elétrica não pode ser superior a alíquota média cobrada pelo Estado.

Dessa forma, ainda sob a vigência do atual modelo de tributação a alíquota deveria ser 17%. E, caso venha a ser aprovado o ICMS SINTA 4.0 com alíquotas que variam de 12% a 18%, o ICMS sobre as faturas de energia elétrica não poderiam ser superiores a esses patamares.

Os contribuintes, realmente, são fregueses no quesito arrecadação de ICMS no Estado de Mato Grosso.